segunda-feira, 28 de julho de 2014

RENDIMENTO PRÁTICO / AQUISIÇÃO TÉCNICA DE TINTAS


Prezados senhores, famintos por conhecimento, amantes do tema e curiosos, depois de quase um ano decorrido após minha última postagem venho novamente me fazer presente e mostrar que o blog não está abandonado.

A adoração pela indústria me fez percorrer por outros caminhos, investir em cursos de outras áreas (soldagem, controle dimensional, equipamentos, etc.), porém a boa e velha pintura industrial não está e nunca esteve esquecida por mim. O conhecimento adquirido e colegas feitos neste período jamais serão esquecidos, mas após respirar novos ares decidi que devo e quero voltar a investir em conhecimentos de pintura industrial/corrosão e proteção, em geral.

Recentemente pude participar do curso de Inspetor de Pintura Industrial Nível 2 da ABRACO, em sua sede situada na Praça Mauá e de grande proveito foi e muita satisfação tive em poder ver novamente nossos mestres, tão conhecidos por todos que aqui passarem.

De muita importância e aprofundados foram os conhecimentos passados, bem como trabalhos técnicos de temas e pesquisas recentes, porém ao concluir o curso, o inspetor que outrora entrara na sala com a visão de um inspetor nível 1, saíra da mesma um profissional da área de corrosão e proteção mais maduro, mais analista e também com poder de decisão. Um inspetor que trabalha e tem em seu escopo apenas reprovar ou aprovar, é um profissional limitado e carece de conhecimento; além dos ensinamentos prestados neste período, o candidato é passado por uma espécie de treinamento que, para os afortunados, há a absorção da filosofia (sim, pintura industrial não é ciência exata e precisa ser entendida/interpretada num todo) que é o tema pintura industrial, e não apenas reprovações em sequência e sem estudo, fazendo com que o profissional que decidira sair da escuridão (metaforicamente e sem ofensas), possa enxergar a pintura além de normas, além de faixas e papéis, mas entender sobre pintura anticorrosiva. Não pense senhores, que por estas palavras sou alguém detentor do conhecimento, mas sim de um curioso e eterno aprendiz, porém que também já investiu argumentos e tempo contra amigos de profissão dominados pela ignorância, visão estreita e detentores de suas magnificas carteiras (certificados), mais preocupados com elas do que com a plenitude da pintura industrial.

Acabada essa explanação inicial, gostaria de hoje comentar um fato que deve afetar muitos inspetores e colegas de área, principalmente os que, igual a mim, trabalham em cabine de jato (empresa exclusivamente prestadora de serviços de pintura), que é o rendimento de tintas, o que por muita das vezes é mal interpretado por pessoas não oriundas da área de pintura industrial e às vezes, quando não se pode mais perder tempo, que é no final da obra, as partes envolvidas são levadas a investirem tempo em uma troca de argumentos, onde a mais prejudicada é sempre a obra em si; há também a questão comercial do fabricante de tintas e a questão do consumo (excessivo) de tintas por meio dos aplicadores, mas que não faz parte de nosso escopo.

Ao fazer o levantamento do quantitativo de materiais (tintas) ou aquisição técnica de tintas para uma determinada obra, diversos fatores devem ser levados em conta, como preço, o tão conhecido teor de sólidos por volume, diluição recomendada para aplicação (se aplicável), espessura por camada, intervalos de repintura, etc. e um estudo simples, porém que requer tempo, do rendimento prático da tinta deve ser feito, e tal estudo vai muito mais além do que a trivial equação onde se considera o teor de sólidos por voluma da tinta, multiplica-se por 10 e do resultado divide-se pela espessura seca requerida e muito mais além que do resultado obtido, considerar que 20% da tinta é jogado fora na aplicação, variando de acordo com o método de aplicação, encontrando assim o rendimento prático da tinta.

Primeiramente, deve-se entender que o tão falado fator de perda não se trata da tinta que se “perde” no ato da aplicação, que de 1L de tinta aplicada em tubos de DN 10” (por exemplo) teremos apenas 700ml depositados na superfície. O termo fator de perda é um fator a ser considerado e ajustado para com uma determinada aplicação, o qual representa a quantidade de tinta necessária para se garantir que toda a superfície se encontra com o mínimo de proteção de acordo com o especificado, que há ao longo do revestimento áreas com espessura acima do especificado, porém que há distribuído ao longo do substrato ao menos o mínimo requerido, além de que a tinta considerada “jogada fora” está nos vales encontrados em um perfil de rugosidade, nos pontos de sobrepasse, etc.

Uma aquisição técnica de tintas bem elaborada deve considerar vários outros fatores, os quais raramente são de conhecimento dos compradores. Há sim uma tabela orientativa a ser seguida, no que diz respeito ao fator de aproveitamento (Fa) e a serem acrescidos ao levantamento, temos o coeficiente de rugosidade (Cr), considerando a primeira demão de tinta (direto no substrato e sob influência da altura do perfil de ancoragem), da segunda demão e da terceira em diante, há também o fator de molhabillidade a ser considerado que é distinguido apenas pela tinta ser monocomponente ou bicomponente e a geometria do equipamento a ser revestido, que está inserido no fator de aproveitamento/aplicação.

Façamos, portanto, uma comparação dos dois métodos de levantamento de consumo de tinta para ver a diferença significativa na quantidade de materiais (tintas) necessários e como isso por anos vem assombrando e desgastando profissionais da área. A avaliação comparativa de custos é assunto para outra postagem, estamos aqui fazendo a comparação dos métodos de levantamento de quantitativo de materiais, admitindo-se materiais (tintas) de mesmas propriedades e valores, com intuito de demonstrar a diferença encontrada pelas diferentes considerações na hora da compra da tinta.

- Método 1 (popular):

Fórmula Rendimento Teórico (RT): (SVx10)/EPS
Fórmula Rendimento Prático: RT x Fa (parcela aproveitável da tinta aplicada – fator de aproveitamento)

- Método 2 (ideal):
(adoraremos a fórmula para o rendimento da primeira demão de tinta, a qual tende a mostrar maior discrepância)

Fórmula: [(SVx10)/(EPS+10xCr)] x Fm x Fa


- Organizemos e consideremos tais dados para preenchimento de ambas as fórmulas:


  • Área a ser pintada: 1000m² de tubos em local abrigado, aplicado por meio de pistola sem ar;
  • Sólidos por volume da tinta (SV): 80%;
  • Espessura da película seca (EPS): 100 micrometros;
  • Fator de molhabilidade (Fm): 0,97 (para tintas bicomponentes);
  • Coeficiente de rugosidade (Cr): 5,4 (valor tabelado considerado para um perfil de 80 micrometros);
  • Fator de aplicação (Fa): 0,50 (valor tabelado e orientativo).


Temos, portanto:

- Método 1:

RT = (80x10)/100 => 8,0
RP = 8,0 x 0,50 => 4,00m²/L

Logo, temos um RP de 14,40m²/galão de 3,6L ou 72,00m²/balde de 18L.

Quantidade de tinta necessária para a obra: 70 Galões de 3,6L.

-Método 2:

RP = [(80x10)/(100+10x5,4)]x0,97x0,5 => 2,52m²/L

Logo, temos um RP de 9,00m²/galão de 3,6L ou 45m²/balde de 18L.

Quantidade de tinta necessária para a obra: 112 Galões.


Conclusão: Obtivemos como diferença a quantia de 42 galões de tinta, quantia de grande relevância para uma pequena área de 1000m². Se adotarmos todos os parâmetros e contarmos com todos os contratempos e variáveis no processo da pintura, acabaremos por considerar a fórmula de número 2 e certamente um rendimento muito diferente dos valores informados pelas fichas técnicas de produtos dos fabricantes de tintas; talvez não devamos ser tão pessimistas quanto ao rendimento de tinta da obra, mas devemos ter o conhecimento dos outros parâmetros que devem ser levados em conta num estudo de aquisição técnica de tintas, a fim de evitar surpresas na reta final da obra e no orçamento e custo levantado.
Por diversas vezes tive problemas com clientes que faziam seus cálculos e eram ferrenhos quanto à ideia de que um galão de tinta de poliuretano acrílico, a exemplo, norma Petrobras N-2677, deve render cerca de 27m² por galão de 3,6L. Desafio aos senhores fazer o teste e encontrar tal valor; no final, temos o cliente reclamando e alegando que o fabricante de tintas disse que rendia X m²/L, que o aplicador consumiu tinta excessivamente; por fim, uma reunião é formada e a aplicação da tinta é realizada com todos em presença, mas que no final está sempre o fabricante ressaltando as letras minúsculas tidas como observação no boletim técnico quanto aos diversos fatores que influenciam o rendimento da tinta, não contemplados no início pelo comprador e, como disse anteriormente, sofre penalidade a obra.
Portanto senhores, um cuidado ao calcular-se o rendimento de tinta para uma determinada obra deve ser tomado e a consciência de que a pintura deve ser levada a sério, contemplando os requisitos gerais e específicos para cada caso, os padrões de qualidade e a utilização de produtos de qualidade e mão de obra qualificada é de extrema urgência. Sabemos amigos do ramo, que a nossa área pode ser considerada uma área ingrata, onde num projeto (não generalizando) em tudo se é permitido pequenos atrasos, na especificação e compra de materiais, na fabricação, no transporte e nos ensaios dos componentes a serem pintados, mas que ao final, somado todos os atrasos, o tempo para uma execução justa e perfeita da pintura é quase uma missão impossível, o que requer muita destreza da equipe; sofremos por fazer parte da etapa final do projeto, o que não significa que seja menos importante, pois muitos ignorantes acham que pintura não é obra, que basta “melar o ferro” e pôr o projeto para funcionar, mas esquecem de que após o início das atividades de uma planta industrial, a sua paralização para corrigir os erros e a o reparo da falha prematura do revestimento custa o valor da obra inteira; pense em repintar todo um navio pintado sem critérios e que está apresentando falhas precocemente, parar toda uma linha de dutos submersos ou enterrados ou um tanque de armazenamento de uma refinaria.


Senhores, quero me desculpar de antemão caso tenha cometido algum erro ao longo de meu trabalho, tanto técnico quanto semântico e para os interessados, pode me contatar para um intercâmbio de informações. Informo também que o conteúdo e a bibliografia não são de minha autoria, mas sim dos mestres já conhecidos por nós, tive como base trabalhos técnicos também e, como sempre, todo o conteúdo apresentado em meus posts são de interpretação pessoal.


Agradeço aos que tiveram paciência e interesse em todo o meu texto e leram até o final e gostaria de encerrar essa explanação citando uma frase que gosto muito:


“QUE O FUTURO NÃO SE ENCONTRE COM DIFICULDADES QUE NÓS PRÓPRIOS CRIAMOS POR FALTA DE AMBIÇÃO AO PROJETAR”

CAMINÕS. De José Luiz Escário. Madrid 1943.